Os cuidados odontológicos em pacientes hospitalizados em cuidados paliativos são fundamentais para promover conforto, prevenir infecções e preservar a dignidade do paciente. A cavidade oral, frequentemente negligenciada nesses contextos, pode se tornar fonte de dor, sofrimento e comprometimento da alimentação e comunicação. Este protocolo visa orientar profissionais de saúde na implementação de um plano integrado de cuidados orais, respeitando a autonomia e priorizando o bem-estar do paciente.
1.Avaliação Inicial e Contínua: A Base da Intervenção Humanizada
1.1 Anamnese Odontológica e Exame Bucal
- Levantar histórico de doenças bucais, uso de próteses, queixas atuais e hábitos de higiene oral.
- Avaliar estruturas craniofaciais, dentárias e mucosas, verificando dor, xerostomia, lesões, infecções, sangramentos, halitose e próteses mal adaptadas.
1.2 Avaliação da Dor Orofacial e Higiene Bucal
- Utilizar escalas como EVA ou END para mensurar a dor.
- Observar a autonomia do paciente para higiene bucal e ajustar as condutas conforme sua limitação funcional.
1.3 Reavaliações Frequentes
- Realizar exames regulares da cavidade oral, ajustando os cuidados à progressão da doença.
2. Plano de Cuidados Odontológicos: Prevenção, Alívio e Dignidade
Os cuidados odontológicos em pacientes hospitalizados em cuidados paliativos devem englobar medidas preventivas, curativas e paliativas.
2.1 Medidas Preventivas
Higiene bucal duas vezes ao dia com escova macia, creme dental com flúor e gaze com clorexidina utilizando escova de dentes macia, creme dental com flúor e, se necessário, soluções antissépticas bucais (como clorexidina 0,12% embebida em gaze estéril).
- Para pacientes com dificuldade de abrir a boca: Utilizar equipamentos portáteis e insumos para auxiliar na abertura e estabilização bucal.
- Realizar a higiene da língua: Utilizar limpadores linguais.
- Orientar pacientes e cuidadores: Sobre técnicas adequadas de higiene oral, incluindo o cuidado com próteses dentárias. As orientações devem ser claras e adaptadas à capacidade de compreensão do paciente e cuidador.
- Alívio da Xerostomia (Boca Seca): Promover a hidratação oral frequente com água ou pequenos goles de líquidos. Utilizar saliva artificial e hidratantes bucais em gel para aliviar o desconforto. Orientar sobre a importância de evitar alimentos cítricos, condimentados, picantes ou quentes, que podem irritar a mucosa ressecada. Considerar o uso de chá de camomila gelado.
- Orientação Dietética: Oferecer uma dieta macia, evitando alimentos que possam causar dor ou irritação na mucosa oral.
2.2 Medidas Curativas e Paliativas
- Manejo da Dor Orofacial: Administrar analgésicos conforme a prescrição médica, seguindo a escada analgésica da OMS. Considerar o uso de medicações tópicas anestésicas para alívio local da dor em feridas. Em casos de mucosite oral, o laser terapêutico de baixa potência pode ser utilizado para prevenção e diminuição da dor, se disponível.
- Tratamento de Lesões Bucais: Realizar a limpeza e proteção de feridas intra e extraorais com soluções adequadas. Para odor nas feridas tumorais, podem ser utilizados bochechos com solução de bicarbonato de sódio ou metronidazol diluído (após avaliação e prescrição médica).
- Manejo de Infecções Oportunistas (Candidíase Oral): Utilizar antifúngicos sob a forma de bochechos ou outras apresentações, conforme prescrição médica. Manter a higiene rigorosa das próteses dentárias.
- Cuidados com Próteses Dentárias: Orientar sobre a limpeza adequada das próteses. Ajustar próteses desadaptadas que possam causar traumatismos na mucosa. Em casos de diminuição da retenção da prótese devido à xerostomia ou perda de volume facial, considerar a aplicação de adesivos e lubrificantes à base de água.
- Manejo da Mobilidade Dentária e Focos Infecciosos: Realizar raspagem supragengival para remoção de placa e cálculo, se a condição clínica do paciente permitir. Considerar a esplintagem (contenção) de dentes com mobilidade, se indicado para melhorar o conforto e a função. O alisamento de superfícies dentárias pontiagudas pode ser realizado para evitar traumas mucosos.
Adaptação de Formulações: Em pacientes com dificuldade de deglutição ou outras vias de administração (sonda nasogástrica), adaptar formulações de medicamentos orais em conjunto com a farmácia hospitalar e a equipe de cuidados paliativos.
3. Educação e Suporte: Humanização e Cooperação Interdisciplinar
3.1 Pacientes e Familiares
- Fornecer informações claras e objetivas sobre a importância dos cuidados orais, as técnicas de higiene, o manejo dos sintomas e os recursos disponíveis. Oferecer suporte emocional e psicológico.
3.2 Equipe de Saúde
Promover a educação continuada da equipe hospitalar sobre os cuidados orais em pacientes paliativos, ressaltando a importância da integração da odontologia na equipe multidisciplinar.
4. Registro e Comunicação: Organização e Segurança Assistencial
- Documentar todas as avaliações, condutas e reavaliações no prontuário.
- Monitorar a efetividade das intervenções, promovendo ajustes conforme necessário.
- Manter fluxo constante de comunicação com a equipe de cuidados paliativos.
5. Considerações Éticas e Logísticas
- Respeito à autonomia: Cada decisão deve considerar a vontade do paciente.
- Evitar intervenções invasivas: Procedimentos devem ser confortáveis e benéficos.
- Disponibilidade de insumos: Garantir materiais básicos de higiene oral no hospital.
- Comunicação eficaz: O cirurgião-dentista deve integrar-se ativamente à equipe paliativa.
Conclusão: A Importância da Odontologia na Terminalidade da Vida
Os cuidados odontológicos em pacientes hospitalizados em cuidados paliativos são uma poderosa ferramenta para aliviar o sofrimento e oferecer dignidade. Ao promover saúde bucal, o cirurgião-dentista contribui diretamente para a qualidade de vida do paciente, mesmo em sua fase final. Essa atuação não é apenas técnica — é, acima de tudo, ética, compassiva e essencial.
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